(R)evolução digital no setor energético

O futuro da transição energética joga-se no plano das tecnologias digitais

23 de junho, 2021
Revolução digital no setor energético
O combate às alterações climáticas e a necessidade de descarbonizar as economias está invariavelmente presente na agenda de todos os setores industriais, pelo que o setor da energia assume um papel central nesta luta. A magnitude dos desafios que se colocam exige-nos a procura de soluções sem precedentes para uma transição energética neutra em carbono, que se fará acompanhar, necessariamente, de uma transformação digital no setor elétrico.
Ao longo dos últimos anos, temos assistido a uma crescente preponderância de fontes de energia de origem renovável. Em Portugal o peso da produção de energia elétrica a partir de fontes de energia renovável aumentou de 30.3% em 2000 para 55.4% em 2020. Este cenário espelha bem o forte investimento que se registou na produção eólica com o virar do século, similar àquela que se assiste hoje na esfera da energia fotovoltaica.
Se os primeiros 20 anos do século XXI foram marcados por um grande desenvolvimento na área das renováveis, o futuro que se perspetiva será profundamente transformativo para todo o setor. Exemplo disso, são as metas estabelecidas no Plano Nacional de Energia e Clima para 2030.

Este quadro de políticas reforça o papel das renováveis como alavanca para a descarbonização, dando particular destaque à energia fotovoltaica, com um pipeline de novos projetos de mais de 8 GW. Esta crescente democratização da produção fotovoltaica e consequente eliminação de obstáculos tem levado à promoção de soluções distribuídas, como é o caso das unidades de pequena produção (UPP), unidades de produção em autoconsumo (UPAC) e comunidades de energia renovável (CER). Se, por um lado, a eliminação desses obstáculos será transformadora por si só, por outro traz consigo desafios consideráveis, que vão muito além da tangível alteração do panorama da produção elétrica, e cujas mudanças impactam a indústria da energia de forma transversal.

As mudanças promovidas pela transição energética e pela disseminação da energia fotovoltaica resultam numa combinação de três fatores game-changers:

(1) uma crescente competição entre todos os players ao longo da cadeia de valor do setor da energia;

(2) um aumento da complexidade na gestão dos seus recursos e respectiva disponibilidade;

(3) e uma menor previsibilidade dos negócios, associada à natureza volátil das fontes de energia fotovoltaica.


As combinações destes fatores constituem condições impulsionadoras do desenvolvimento de inovações tecnológicas.

Por esta razão, o tema da discussão da transição energética e energia fotovoltaica, que não pode, nem deve ser descontextualizado da era da transformação digital em que vivemos, viu a sua urgência reforçada pela crise pandémica da Covid-19.

Não é por acaso que o digital se assume como facilitador da mudança profunda com a qual nos deparamos hoje. A escalabilidade e a automatização das soluções, a análise de dados e as tomadas de decisão com base numa análise preditiva são alguns dos fatores que fazem das soluções tecnológicas de base digital a escolha incontornável, que impactará todos os players da cadeia de valor: Utilities, com uma complexidade acrescida, intrínseca à geração fotovoltaica distribuída, colocarão a gestão da rede elétrica no epicentro de inovações de data analytics para a tomada de decisões; Promotores de energias renováveis, que assistem a um ambiente crescentemente competitivo, procurarão necessariamente soluções que garantam previsibilidade e rentabilidade dos seus ativos; Prestadores de serviços, que terão de se reinventar para fazer face a clientes cada vez mais exigentes e com expectativas de maior proximidade; e empresas de EPC, que verão as suas competências expandir-se para além do ‘físico’, acrescentando maior valor aos projetos, procurando diferenciar-se e agregar valor desde a fase de conceção.

O exemplo do impacto que a transformação digital pode ter é descrito num estudo recentemente elaborado pela McKinsey, no qual se reconhece que a aplicação de soluções digitais em empresas de energia pode gerar ganhos até 30% na estrutura de custos de projetos solares. Em abono da verdade, desde cedo, o digital tem estado ao serviço deste combate, estando na génese de uma simbiose perfeita entre técnicas de controlo digital e eletrónica de potência, dando vida a inversores solares e carregadores de veículos elétricos.

As potencialidades do digital na área fotovoltaica são hoje inúmeras, com o aparecimento de projetos piloto envolvendo tecnologias como machine-learning, inteligência artificial ou robótica. A utilização destas tecnologias tem-se revelado fundamental para o aumento da disponibilidade dos ativos produtores de energia, materializando-se em soluções de promoção da eficiência operacional das instalações, como é o caso de plataformas de gestão e processamento de dados de centrais solares ou sistemas robotizados de manutenção preventiva de painéis solares.

Mas, se por um lado, muitas destas áreas do digital apresentam tremendas oportunidades, as suas complexidades são igualmente significativas e devem ser acauteladas. Os desenvolvimentos de tecnologias nesta área abarcam áreas distintas das competências tradicionais do setor da energia. Por isso, para que possamos garantir o sucesso da transição energética, é essencial que todos os agentes colaborem, procurando encontrar sinergias e soluções para problemas comuns, levando a inovações persistentes e transformadoras. Só assim esta mudança será efetiva, constituindo uma oportunidade para uma maior capacitação do capital humano das empresas do setor.

Embora o sucesso da transição enérgica dependa de uma transformação digital bem-sucedida, é importante que o papel da tecnologia não assuma uma supremacia sobre aquele que é o objetivo primordial – a energia.

Fonte: oinstalador.com